segunda-feira, janeiro 23, 2006

Os novos amigos subindo-lhe à cabeça

Quando nessa tarde desceram, como era hábito, ao Jardim, Lunata estranhou Demiurgo. Notava-lhe um alheamento que não lhe era familiar, uma distracção que não se lhe apresentava comum, e – estes, sim, foram os sinais que mais a preocuparam – um sorrisinho irritante e umas respostas de gosto duvidoso que Lunata desconhecia ao amigo.
Era verdade que Demiurgo, a fazer jus à sua nobilíssima genealogia, era um snob, mas tal não significava que fosse convencido, nem muito menos tonto. Mas foi como tonto que se portou nessa tarde, rejeitando as sugestões e ideias dela, substituindo-as por opiniões de Pessoa ou Mann, não, deixa estar, eu pergunto ao meu amigo Fernando, dizia, ou ainda O meu amigo Thomas acha isso um disparate, sempre coroadas desse irritante e ignóbil sorrisinho.
Lunata afastou-se a pretexto de ir cumprimentar os peixes do lago, deixando Demiurgo sentado no banco ripado, entregue em pensamentos a esses seus novos (grandes) amigos. Pateta, exclamou. Amigos, qual quê! Mas onde estavam esses amigos quando, às portas da morte, delirava de febre?! Onde estavam esses amigos quando, eufórico, caçou a primeira imagem? Onde estavam esses amigos quando, todos os dias, àquela hora, desciam ao Jardim?
Ela, sim, era sua amiga. Os outros… os outros apenas pairavam pela sua cabeça
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2 Comments:

Blogger JNM said...

...nunca existiram...

É tão difícil suportar a realidade quando um pretexto nasce para fugir dela.

beijo

9:39 da tarde  
Blogger Sofia Bragança Buchholz said...

Na "mouche", Ahraht!

Beijo

1:45 da manhã  

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