Números arriscados
Estou outra vez na Alemanha. A poucos metros de minha casa encontra-se acampado um circo. Um circo imenso, rico, repleto de animais e caravanas, com uma tenda faustosa encimada por quatro coroas a denunciar-lhe o nome: Krone.
Nele abundam cavalos (mais de sessenta, informa a sua página na Internet), elefantes, leões, lamas, camelos, zebras, cabras, burros, pombas, cães e, até, um rinoceronte. O preço dos espectáculos é também ele nobre, podendo rondar os quarenta euros, havendo, contudo, a plebeia opção de, por quatro, visitar, apenas, a bicharada.
Não gosto de circos. Não gosto da estética, nem da ideia de existirem animais selvagens a executarem, sob a ordem ˗ supostamente superior ˗ de humanos, números acrobáticos patéticos. Acho tal humilhante para tão nobres especímenes. Desagrada-me também vê-los confinados a espaços diminutos, acorrentados, movendo-se repetidamente, para um lado e para o outro, num hospitalismo evidente, apesar das informações da Direcção garantirem o cuidado nos seus tratos e a sua aprovação por parte de organizações de protecção de animais. Contudo, as reminiscências do meu imaginário infantil e a minha curiosidade, sobrepõem-se à razão e impelem-me, frequentemente, a ir observar de perto este controverso universo.
Assim, todos os dias passeio junto aos portentosos elefantes, dirigindo-lhe palavras afectuosas solidárias, relembrando o destino trágico da mãe do Dumbo, ou passo perto do pequeno burrito imaginando-o um menino preguiçoso transformado, qual Pinóquio, em asinino, por castigo. Mio, ternamente, em frente do majestoso leão branco, ex-libris do circo, tomando-o por um pequeno felino doméstico, sendo arrastada para a realidade sempre que este resolve soltar os pulmões e rugir à desgarrada com o macho dourado da jaula oposta. Gosto também de escutar as conversas das acrobatas eslavas, agrestes na pronúncia e no tom, falando, talvez, de invejas amorosas, e ver a trupe chinesa do Shaolin Kung-Fu fazer exercícios de aquecimento nas traseiras da tenda, antes de entrar em cena. Mas o meu número predilecto, o meu preferido, aquele que me arranca gargalhadas de me fazerem vir as lágrimas aos olhos, é assistir às expressões dos inocentes infantes germânicos, quando os seus pais, longe de esperarem tal espectáculo, os levam a ver os animais, e perversos caniches brancos, encaixados uns nos outros, numa verdadeira performance acrobática, encetam em grupos de quatro ˗ ou mais! ˗ arriscados e difíceis comboinhos homossexuais.
© Foto: Sofia Bragança Buchholz
Nele abundam cavalos (mais de sessenta, informa a sua página na Internet), elefantes, leões, lamas, camelos, zebras, cabras, burros, pombas, cães e, até, um rinoceronte. O preço dos espectáculos é também ele nobre, podendo rondar os quarenta euros, havendo, contudo, a plebeia opção de, por quatro, visitar, apenas, a bicharada.
Não gosto de circos. Não gosto da estética, nem da ideia de existirem animais selvagens a executarem, sob a ordem ˗ supostamente superior ˗ de humanos, números acrobáticos patéticos. Acho tal humilhante para tão nobres especímenes. Desagrada-me também vê-los confinados a espaços diminutos, acorrentados, movendo-se repetidamente, para um lado e para o outro, num hospitalismo evidente, apesar das informações da Direcção garantirem o cuidado nos seus tratos e a sua aprovação por parte de organizações de protecção de animais. Contudo, as reminiscências do meu imaginário infantil e a minha curiosidade, sobrepõem-se à razão e impelem-me, frequentemente, a ir observar de perto este controverso universo.
Assim, todos os dias passeio junto aos portentosos elefantes, dirigindo-lhe palavras afectuosas solidárias, relembrando o destino trágico da mãe do Dumbo, ou passo perto do pequeno burrito imaginando-o um menino preguiçoso transformado, qual Pinóquio, em asinino, por castigo. Mio, ternamente, em frente do majestoso leão branco, ex-libris do circo, tomando-o por um pequeno felino doméstico, sendo arrastada para a realidade sempre que este resolve soltar os pulmões e rugir à desgarrada com o macho dourado da jaula oposta. Gosto também de escutar as conversas das acrobatas eslavas, agrestes na pronúncia e no tom, falando, talvez, de invejas amorosas, e ver a trupe chinesa do Shaolin Kung-Fu fazer exercícios de aquecimento nas traseiras da tenda, antes de entrar em cena. Mas o meu número predilecto, o meu preferido, aquele que me arranca gargalhadas de me fazerem vir as lágrimas aos olhos, é assistir às expressões dos inocentes infantes germânicos, quando os seus pais, longe de esperarem tal espectáculo, os levam a ver os animais, e perversos caniches brancos, encaixados uns nos outros, numa verdadeira performance acrobática, encetam em grupos de quatro ˗ ou mais! ˗ arriscados e difíceis comboinhos homossexuais.
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