segunda-feira, julho 05, 2010

A culpa não é minha; é dele!

Um fim de tarde magnifico. Uma amiga telefona-me, desafiando-me para um passeio à beira mar. Eu resisto. Digo que não, que tenho de trabalhar. Sem vontade, arrasto o portátil para a varanda − na tentativa de me iludir de que não estou a perder os últimos raios de sol − e preparo-me para rever o meu próximo trabalho literário, pendente há uma data de tempo. O silêncio reina, as ruas estão desertas, pois na televisão joga um dos favoritos do campeonato do mundo de futebol. Só a natureza, ao longe, dá sinais de vida com o piar ávido das gaivotas sobrevoando o Atlântico. Sento-me. Rodeio-me das várias versões do manuscrito, abro o Word. Esforço-me para me concentrar. Aqueço os dedos, como um pianista, preparando-me para debitar a primeira palavra. Mas eis que sou interrompida pelo som estridente do grilo que habita a gaiola em cima do frigorífico. Um som agudo, alto, muito alto, que me agride os ouvidos, me fere os tímpanos, levando-me constantemente, quando estou perto dele, a equacionar pô-lo porta fora, quebrando, desta vez, com a tradição anual de todas as Primaveras, pelas festas populares, comprar um destes insectos cujo cantar anuncia o Verão.
Desligo o portátil, pego no telemóvel e marco:
− Estou, Ana? Onde estás que vou ter contigo?!

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1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Extremamente bem escrito!
Perfeito!
Só me resta mesmo dizer...
Há coisas que não podem deixar de ser feitas, porque mesmo que queiramos, a nossa mente insiste em ir contra a nossa fingida vontade, e assim, nunca conseguiremos fazer seja o que for, porque ela, vence sempre!
I.L.
http://wwwomenworld.blogspot.com/

4:16 da manhã  

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