É sempre a mesma coisa, quando entro numa dessas grandes ópticas para comprar lentes de contacto e chega a hora de registarem a compra, pedem-me o nome da “fichinha”. Não há fichinha. Como não há, não é nossa cliente? Olham-me e reconhecem-me como habitué. Sou, mas não deixo os meus dados. Comprar lentes é, para mim, como comprar camisolas ou calças. Ou champôs. Ou cremes da cara. Não preencho fichas em lojas de roupa, nem em nenhuma outra onde não veja qualquer justificação plausível e do interesse do consumidor para isso. Ah, mas tem de ser! O sistema obriga a inserirmos os dados., insistem, consecutivamente. Quero lá saber do sistema! Inventem o que quiserem, os meus dados é que não põem aí!, repito vezes sem conta. E depois explico, educadamente, que não é nada contra elas, funcionárias, mas que sei como as coisas funcionam, que sou da área de marketing e que os elementos que elas inocentemente ali introduzem concentram informações valiosas sobre o perfil dos consumidores: quem são, que idades têm, onde vivem, o que compram… Elas miram-me, cépticas, e vejo-me obrigada a baixar o nível para entenderem. Dou exemplos. Explico que uma vez criei um nome fictício e que ainda hoje me chegam a casa cartas de empresas que nada têm a ver com aquela a quem dei os dados, porque esta os vendeu. Dizem-me que ali, basta “pôr uma cruzinha” que os dados não são passados a mais ninguém. Informo-as de que essa cruzinha vale zero. Elas olham-me ainda mais incrédulas, a pensarem que quem não percebe nada do assunto sou eu. Pacientemente, continuo com os exemplos. Que recebo mensagens de publicidade de um Health Club que nunca na vida frequentei, só porque uma vez, numa visita para ver se me interessava, cometi o erro – e que grande erro para quem percebe da poda! – de preencher uma dessas fichas. E pus a tal cruzinha!, acrescento, antes que argumentem. E explico-lhe que é um daqueles números cujo remetente é impossível de contactar e que mas enviam constantemente a qualquer hora do dia. Falo-lhes dos Cartões Continente e Jumbo e mais não sei do quê, e dos seus “fantásticos” descontos. Lembram-se que no início havia descontos em quase tudo? E agora, hein? Elas começam a ceder e a anuir com a cabeça, que sim, que queriam era apanhar-nos e que agora nada de descontos. E na IKEA, porque nos perguntam o código postal? Para saberem onde os consumidores vivem, para abrirem novas lojas onde se justifique, por exemplo. E sem pagarem nada a estes pelos dados que fornecem para esses estudos! E elas a seguiram-me, graças a Deus, que a minha paciência começava a esgotar-se. E já de nota em riste preparo-me para pagar e elas têm uma regressão brutal: mas aqui não é assim. Aqui somos um grupo internacional que não faz nada disso. Ora bolas! Se me dissessem que eram uma loja de bairro dava-vos mais depressa os dados!, exclamo já sem a mínima paciência. E uso trunfos mais valiosos: ameaço que vou comprar à loja do lado (que sei que me vai fazer a mesma coisa, mas elas não); que não têm consideração pelos clientes; que quero o livro de reclamações, que aquilo não é obrigatório, coisa nenhuma... E elas lá acabam por ceder e por criar uma ficha à toa e passarem-me manualmente o recibo. E lá ficamos outra vez “amigas”, às desculpas umas às outras, porque também me custa, digo-vos, sinceramente, falar assim com estas raparigas, que, coitadas, não percebem nada do assunto e que estão instruídas pelos responsáveis para procederem desta forma. Mas a verdade é uma só: saio da loja exausta e indisposta a pensar: fosse eu mais organizada e comprava com tempo na net! Era limpinho! Ao menos, não me chateava!