Se há coisa que me maça, é aquele discurso do tempo da outra senhora, do antigamente é que era bom. Antigamente é que se lia, antigamente é que se aprendia, antigamente é que se era culto… Antigamente, faziam-se as contas de cabeça, liam-se os clássicos à luz da vela, recitavam-se os poetas de cor. Como se o sacrifício e a falta de meios tecnológicos fossem sinónimos de literacia! Antigamente, também, a informação chegava em escassez a uma minoria, imensas mulheres não iam à escola e, por mais que isto doa a muita gente, eram sempre os mesmos a fazerem-se ouvir. Ou seja, a editar.
Eu que nem sou de antigamente, mas que fui educada por preceptora particular desse tempo, paga a peso de ouro para ensinar os meninos com os mais eruditos vocábulos e as mais complexas formas da aritmética, não me lembro de em toda a minha instrução primária ter aprendido o aparelho reprodutor, o sistema urinário ou o respiratório. Em contrapartida, o meu sobrinho Tomás, destroca definições de espermatozóides, ovócitos, e ureteres com a mesma facilidade com que domina jogos de tazos e vence níveis na Playstation.
Sabia História, é verdade, que fiquei a odiar por a “cartilha” ter uma imagem tenebrosa para um público daquela idade, de D. Fernando, esquelético, agrilhoado em Fez, com os ratos, famintos, aos pés.
Não dava erros…? Uma ova é que não dava! Dava-os e aos magotes, principalmente no inicio do ano lectivo, quando eram testados – e condenados – com ditados penosos os nossos devaneios de Verão. Doíam-me, a cada segunda palavra riscada, os gelados com que me regalara, e, no fim, já com um 50 a vermelho no canto superior direito, das 100 palavras que compunham o texto, não chorava das reguadas (que estavam proibidas pelos meus pais) mas da vergonha que era ter-me divertido.
As composições eram raras e as temáticas – indicadas – quase sempre as férias ou as estações do ano e quando as relembro e as comparo com as do Tomás que versam sobre sonhos e seres fantásticos, roo-me de inveja!
Sabia, também, de cor, as linhas-férreas nacionais, informação “utilíssima”, aliás, (e a sorte que eu tive de já não ter de aprender as das ex-colónias!) que me serviu “imenso” nesta minha vida viajada, e que hoje, nestes tempos – Oh, Céus! – “perdidos!”, “de ignorância!”, se consegue a um simples gesto, a um fácil clicar e aceder de site.